Nestes dias em que tem sido cada vez mais corriqueiro o pedido de recuperação judicial por parte de empresas consagradas no mercado, o Superior Tribunal de Justiça exarou decisão inédita com de significativa relevância no mundo das licitações públicas. 51393f
Ocorre que a lei geral de licitações e contratos istrativos estabelece que na fase de habilitação de um procedimento licitatório, ou seja, no momento em que as empresas interessadas em vencer os certames e alcançar o direito de contratar com a istração Pública demonstram estar em condições econômicas, fiscais, trabalhistas, etc., se faz mister comprovar tudo isso por meio de documentos, geralmente por certidões.
Assim, na maioria das modalidades de licitação, a empresa participante deve apresentar dois envelopes: um contendo os documentos exigidos na fase de habilitação; e outro contendo a proposta.
Um dos documentos exigidos é a certidão negativa de falência e concordata que, dentre outros, demonstra que a empresa, caso seja declarada vencedora, tenha equilíbrio econômico-financeiro para prestar os serviços ou realizar a obra pública sem prejuízos para o interesse público, em outras palavras, “sem quebrar” durante a execução do contrato.
No entanto, impende notar que tal norma foi trazida ao mundo jurídico por meio de uma lei do ano de 1993, ao o que desde 2005 não se fala mais em concordata no Brasil. De qualquer sorte, tanto a concordata, quanto o instituto da recuperação judicial tem suas similaridades, eis que ambas visam, acima de tudo, buscam evitar a falência, inobstante, em quase todos os casos, as empresas em concordata não lograssem fugir da falência em decorrência dos exíguos prazos para pagamentos que se tornavam impossíveis de serem cumpridos. Muito mais flexível e viável, a recuperação judicial substituiu a concordata. Porém, a lei de licitações faz menção estrita à “concordata”, em nada se referindo a um instrumento legal até então inexistente.
Com isso, não pode ser feita uma exigência impossível de ser cumprida num procedimento licitatório, isto é, exigir-se certidão negativa de concordata e falência. Também não é lícito exigir-se a apresentação de documento que certifique negativamente estar a empresa em recuperação judicial, como uma forma de substituição da antiga concordata. E mais, não pode a istração Pública impedir a participação em licitações de empresas que estiverem em recuperação judicial, sobretudo quando o nicho de mercado de tal empresa for a prestação de serviços à istração Pública.
Essa tese que defendíamos há anos foi, finalmente, acatada pelo STJ em dezembro de 2014, facultando a uma empresa gaúcha em recuperação judicial a participação em licitações, sob o fundamento de ser impossível a exigência de certidão negativa de concordata, tampouco de impedir a participação sob o argumento de a empresa estar em recuperação judicial, pois a lei de licitações faz estrita referência ao instituto da concordata ou falência.
O mais interessante, pela nossa ótica, foi o reconhecimento de que não se deve inviabilizar os atos do comércio em relação a uma empresa que vive de contratos celebrados com a istração Pública, tendo em vista que o escopo primordial da recuperação judicial é facultar condições para que a empresa não “morra”, tendo meios de arcar com seus compromissos sem sair do mercado.
Ainda não houve transito em julgado no caso em comento, mas o precedente tende a prevalecer em julgamento definitivo, de modo que o STJ sinaliza para mais uma importante conquista em favor das empresas em recuperação judicial.
Nestor Fernandes Fidelis